terça-feira, 26 de maio de 2009

Pobres com carro e casa



Há muito que tinha intenção de escrever algo sobre a falta de tino dos Portugueses para as suas contas mensais. Este interesse foi, finalmente, saciado após a leitura de um artigo no “Jornal de Negócios”; o título é elucidativo: “No mundo, há os que poupam e os que consomem”.
Algo que qualquer pessoa deve saber é que as poupanças mundiais podem ter dois destinos: ou continuam depositadas em contas ou são investidas em todo o tipo de bens e serviços. Então quando se diz que Portugal tem um deficit de 2,5%, por exemplo, isso significa que o governo terá de ir ao grande saco da poupança mundial para cobrir a diferença entre as receitas e despesas.
O dito artigo faz revelações espantosas: os Chineses têm 25% da poupança mundial, os Estados Unidos absorvem toda a poupança da China e Alemanha e Portugal absorve 2,7% do total da poupança mundial. Conclui com um excelente frase: “Os Chineses poupam, os Americanos gastam e os Europeus reformam-se
Estes dados são importantes para compreendermos que existe uma clara discrepância entre os termos “Pobre” em diferentes partes do mundo e como, por vezes, agimos egoisticamente, julgando que tudo terá de nos cair nas mãos, apenas porque nascemos no mundo “civilizado e ocidental”.
Certamente se perceberá, após os dados referidos, que existem hoje em dia chineses que dormem em casas sem isolamento térmico, cozinham a lenha e andam de motorizada, mas poupam 25% do seu rendimento, enquanto que Americanos e Europeus possuem casa, relativamente, nova, 1 ou 2 carros, telemóvel em todos os elementos da família e até passam férias; contudo ficam a dever a todo o mundo. Como esta bem de ver, mais tarde ou mais cedo, a torneira fechar-se-á, porque aqueles que verdadeiramente produzem quererão colher os frutos do seu trabalho.
Os políticos têm alguma culpa em não ter tomado o controlo do crédito e das aspirações da classe média, mas agora tudo parece simples de afirmar, porque aquando da adesão ao Euro as taxas de juro estavam historicamente baixas e a economia prosperava.
Apesar de tudo, a verdade é inegável. Grande parte dos novos pobres consubstanciam-se na pseudo classe média que surgiu nos finais da década de 90, mas que depressa se viram a braços com créditos impossíveis de cumprir.
Ficam os números e a lição:

  • 72,9% dos Portugueses têm casa própria, dos quais metade tem segunda habitação (superior à média europeia)
  • Num país de 10,5 milhões de habitantes existem 12,4 milhões de contratos de telemóvel (muito superior à média europeia)
  • 20% da população é pobre

Quem dá passos maiores do que a perna…

terça-feira, 19 de maio de 2009

60%



Será verdade que os partidos políticos querem combater a corrupção? Será que o decreto-lei, recentemente, apresentado pelo governo, ajuda no combate à corrupção? Ou será que ajuda no combate ao deficit?
Vamos a factos. O documento que a maioria socialista quer aprovar, indica-nos que a administração fiscal terá plenos poderes para fiscalizar as contas bancárias dos contribuintes, sempre que existir um desfasamento, em mais de 100 mil euros, entre a declaração de IRS e os montantes auferidos durante o ano.
Como é óbvio, se a administração fiscal detectar enriquecimento ilícito, algo de desagradável acontecerá ao contribuinte. É aqui que entram as novidades e que eu considero aberrantes. Então a proposta de lei define que se existir o enriquecimento “injustificado” superior a 100 mil euros, aplicar-se-á uma taxa de 60% sobre esses rendimentos.
Repare-se no ridículo da situação: o contribuinte não declarou, propositadamente, parte dos seus rendimentos num montante superior ou igual a 100 mil euros, rendimentos esses, que proviessem da droga. Aqueles rendimentos que eram ilegítimos, e que põe isso, deviam ser absorvidos pelo estado e o indivíduo julgado, transformam-se em rendimentos parcialmente legítimos, visto que, 40% não são taxados.
Pode-se contra-argumentar afirmando que são os contribuintes que possuem o ónus da prova, isto é, é aos contribuintes que cabe provar que aqueles rendimentos são legítimos e foram declarados, contudo essa argumentação não está totalmente correcta, porque o estado desresponsabiliza-se da sua tarefa de fiscalização, limitando-se a cobrar uma parte dos rendimentos que podem ser ilícitos e, que por isso, deviam ser apreendidos. Parece-me evidente que existe um incentivo à fraude e ao crime, porque apesar de tudo, 40% ficam sempre do lado de cá!
Se eu amanhã roubasse um Ferrari e, no dia seguinte, o vendesse por 100 mil euros e colocasse no banco esses 100 mil euros, caso a administração fiscal suspeite que enriqueci injustificadamente naquele montante, levanta o sigilo bancário e detectaria aqueles rendimentos. Ora aplicar-me-ia uma taxa de 60% ficando, pois, com 60 mil euros e eu com 40 mil euros. Maravilha!
Não pactuo nas críticas que fazem à opção do levantamento do sigilo bancário quando existe, apenas suspeitas de enriquecimento injustificado, porque quem não deve não teme; mas parece-me, verdadeiramente, estúpida a opção de tributação de 60% de rendimentos que podem ser ilícitos. Deixem para lá, o deficit está, outra vez, em alta.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

O fim do mito


No fundo. É desta forma que se pode caracterizar a economia Espanhola. O mito espanhol da pujança económica e equilíbrio das contas públicas está, definitivamente, quebrado.
Das poucas vezes que estive em contacto com trabalhadores emigrados em Espanha, era patente a excitação e orgulho pela situação do país vizinho. Estes trabalhadores sentiam-se como se tivessem descoberto um “eldorado” e criticavam veemente o governo português, por tudo e mais alguma coisa.
Como sempre acontece, uma crise estrutural colocou a nu a fragilidade do crescimento espanhol. O país que outrora crescera a 3 e 4% ao ano, enfrenta uma recessão de, pelo menos, 3% este ano e a prolongar-se até 2010; o país que tinha um superavit orçamental de 3 a 4% do PIB, enfrenta um deficit orçamental em torno dos 7,5% do PIB; o país que possuía uma taxa de desemprego (já elevada) de 9 a 10%, arrisca-se a atingir os 20% de taxa de desemprego (4milhões de desempregados).
A falsa ilusão de riqueza dos espanhóis sair-lhes-á caro e as declarações pomposas de Zapatero “…ultrapassamos o PIB per capita italiano e, em breve, ultrapassaremos o PIB per capita francês.”são alvo de troça.
Os agentes políticos tendem a ignorar a história e isso, por vezes, leva-os a cometer os mesmos erros do passado. Em Portugal assistiu-se a uma bolha imobiliária, entre os anos de 1998 e 2003; assim que a bolha rebentou, as pessoas acordaram e repararam que afinal não estavam assim tão bem.
O mesmo erro foi cometido pelos espanhóis e pelos irlandeses, mas preferiram viver ao sabor da euforia e da festança esquecendo-se que quanto maior é a festa maior é a ressaca. Quem os viu e quem os vê!

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Competitividade vs Produtividade - Parte 2 (Fim)


Ora chegados aqui, importa desmistificar a produtividade e a competitividade como conceitos intrinsecamente ligados. Vejamos o seguinte exemplo: uma empresa têxtil com 40 trabalhadores que esteja a produzir 10000 t-shirts por semana pode ter algumas dificuldades em vende-las no mercado. Contudo se colocar o logótipo “Nike” estampado na frente das t-shirts, não demorara muito até ter de contratar mais pessoal. O que muda de uma situação para a outra é o interesse despertado no consumidor.
Pode-se aumentar a produtividade, isto é, o Valor Acrescentado Bruto (Receita líquida de despesas operacionais, à excepção de amortizações e imparidades) por trabalhador, sem aumentar a competitividade; basta que para isso, não possua um bom canal de distribuição, não possua uma boa visibilidade no mercado, existam produtos substitutos no mercado, o poder negocial dos clientes seja elevado, o poder negocial dos fornecedores seja elevado ou a ameaça de entrada de concorrentes seja elevada.
Da mesma forma, uma empresa pode tornar-se mais competitiva sem que tenha de tornar-se mais produtiva, pois poderá possuir um nível de notoriedade no mercado muito superior às suas concorrentes, o que lhe permite vender com preços mais elevados.
Puxando a sardinha à minha canastra, falarei do sector da cortiça. Já muito se disse e eu já afirmei que, se o sector corticeiro quiser enfrentar a concorrência dos vedantes de plástico, de frente, arruinar-se-á. O problema é que os consumidores estão abandonar as bebidas que, tradicionalmente, usavam vedantes de cortiça e, aquelas que usavam, começam a redireccionar-se para os vedantes de plástico, cada vez mais fiáveis e mais baratos. Numa situação destas, os corticeiros não podem forçar os consumidores a beber mais vinho e champanhe, nem podem forçar os seus trabalhadores a receber 150€ por mês, para se tornarem mais competitivos. O que podem eles fazer? Passarem a produzir as rolhas de plástico, redireccionarem o segmento do vedante de cortiça para o consumo de luxo e mais refinado e apostar na divulgação dos benefícios para o ambiente e para a qualidade do vinho do vedante da cortiça.

Ora chegados aqui, julgo que está na hora dos empresários nacionais possuírem visão de futuro e compreenderem que menores salários poderá traduzir-se em desalento nos trabalhadores, insucesso para o empresário e o colapso para o sector.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Competitividade vs Produtividade - Parte 1


Muito se tem dito ao longo dos anos sobre competitividade e produtividade. Tantas foram as vezes que estas palavras foram usadas que tornou-se claro que existe alguma confusão de conceitos e oportunismo na utilização das mesmas. Quantas vezes já ouvimos na televisão os partidos políticos a digladiarem-se, por mais ou menos aumentos salariais, tendo por base os aumentos (ou não) de produtividade.
Muitas foram as vezes, em que o patronato invocou a impossibilidade de praticar aumentos salariais, porque se aumentasse os salários perdia competitividade; já para não falar de Manuel Pinho que afirmou perante empresários chineses que a economia portuguesa era competitiva, porque “tinha salários baixos”. Quer isto dizer que para algumas pessoas, salários baixos, ou mais baixos do que os outros países, é sinal de competitividade.
Vamos lá ver uma coisa. De facto, os salários baixos permitem que uma economia seja mais competitiva que outra (em iguais circunstâncias) com salários superiores; contudo é um erro grosseiro considerar que a única fonte de competitividade reside nos preços, que por outras palavras é o mesmo que dizer que reside nos salários. Se assim fosse, toda a indústria intensiva em mão-de-obra, como a têxtil, teria desaparecido, visto que, os chineses são imbatíveis nos preços. Como está bom de ver, essa assunção é falsa, porque, efectivamente, muita indústria têxtil desapareceu, mas aquela que inovou e passou a fabricar produtos mais avançados e dirigidos a segmentos específicos do mercado não faliu.
Assim se explica o sucesso de muitas empresas de calçado que dirigiram a sua produção para o segmento de gama alta, saindo do mercado de baixos preços (baixos salários) praticado pelos chineses. Não podemos ignorar o facto de não poder-se empregar tão elevado número de pessoas nestas actividades direccionadas a nichos de mercado, como aquelas que se empregavam ao produzir-se para mercados mais latos de baixos preços. Trata-se de uma questão de escolha: alimentar falsas esperanças ou dizer a verdade às populações...